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CPC 33, o início do fim do Saúde Caixa e dos planos Funcef (parte II)

Publicamos hoje o segundo artigo da série que busca esclarecer as razões políticas que explicam o fato de a Caixa cumprir o pronunciamento contábil CPC 33. Leia também a primeira parte da série já publicada.

CPC 33, o início do fim do Saúde Caixa e dos planos Funcef (parte I)

 O que é e qual a função do CPC?

O Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC) é um órgão supostamente independente, constituído em 2005 pela Resolução nº 1.055 do Conselho Federal de Contabilidade (CFC) e é composto por representantes das seguintes entidades: Associação Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca), Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais (Apimec Nacional), B3 Brasil Bolsa Balcão, Conselho Federal de Contabilidade (CFC), Instituto dos Auditores Independentes do Brasil (Ibracon), Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras (Fipecafi) e entidades representativas de investidores do mercado de capitais.

Além desses, participam regularmente das reuniões do CPC representantes do Banco Central do Brasil (BC), Comissão de Valores Mobiliários (CVM), Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB), Superintendência de Seguros Privados (SUSEP), Federação Brasileira de Bancos (FEBRABAN), Confederação Nacional da Indústria (CNI) e Superintendência Nacional de Previdência Complementar (PREVIC), podendo ainda ser convidados especialistas e outras entidades.

Na prática o papel do CPC é criar um conjunto de documentos denominados pronunciamentos contábeis para propiciar a chamada “harmonização contábil”, cujo significado é modelar a contabilidade das empresas brasileiras de acordo com normas aceitas pela maioria dos países do mundo a fim de facilitar as transações do mercado de capitais nacional e internacional globalizado.

De acordo com o sítio na Internet do CPC, seu objetivo é “o estudo, o preparo e a emissão de documentos técnicos sobre procedimentos de Contabilidade e a divulgação de informações dessa natureza, para permitir a emissão de normas pela entidade reguladora brasileira, visando à centralização e uniformização do seu processo de produção, levando sempre em conta a convergência da Contabilidade Brasileira aos padrões internacionais[1]. (grifo nosso)

O portal do Grupo BLB-Brasil Escola de Negócios é mais claro e didático ao apresentar a explicação dos objetivos da “harmonização contábil”, que é a tradução e adaptação de normas internacionais de contabilidade, as International Financial Report Stardards (IFRS) ou as International Accounting Standards (IAS) para o Brasil, como “Um dos grandes objetivos das IFRS, que pode ser também entendido como uma vantagem para a contabilidade brasileira é o fato de que sua adoção permitiu que a informação contábil ficasse mais acessível sem abrir mão de sua linguagem contábil, já que as demonstrações de todos os países que adotam essas normas têm a mesma estrutura e utilizam, de forma básica, os mesmos mecanismos para contabilização dos fatos que modificam o patrimônio das entidades”… “A harmonização contábil tem como um de seus pilares o aumento da transparência das demonstrações contábeis das empresas brasileiras, buscando uma expansão do mercado de capitais internacional.”[2] (grifos nossos)

Como se pode depreender, trata-se de um sistema a ser adotado por empresas de capital aberto, ou, talvez, de empresas estatais, até então fechadas, cuja intenção de seus controladores seja a abertura de seus respectivos capitais. Será?

Para corroborar essa interpretação, a definição do objetivo expressa pelo CPC em seu sítio, cujo texto está reproduzido acima, se refere à “entidade reguladora brasileira”, a tradução desse termo é Comissão de Valores Mobiliários (CVM), órgão, como se sabe, responsável por regular, exclusivamente, a atuação das empresas de capital aberto no Brasil.

O sistema funciona da seguinte forma: o CPC produz os Procedimentos Contábeis, traduzindo para o idioma português brasileiro e adaptando para a realidade nacional as IFRS e IAS, mas esses pareceres não têm força de norma para as empresas, apenas de recomendação. A CVM, por sua vez, os adota, transformando-os em resoluções, que passam a ser de cumprimento obrigatório pelas companhias brasileiras, mas somente as de capital aberto, obviamente.

Empresas fechadas e a Lei das S/A      

Os procedimentos – CPC, como afirmado, não têm caráter normativo, passando a ser obrigatórios uma vez incorporados pela CVM em suas resoluções, mas não se aplicam, em princípio, a empresas fechadas, como a Caixa, pois esse órgão regulador não tem poder de as obrigar, mas poderão ser adotados por elas, como se vê a seguir.

Em dezembro de 2007, depois de um longo período em debate no Congresso Nacional, foi aprovada a Lei 11.638, que altera a Lei 6.404/1976, conhecida como “Lei das S/A”. O Parágrafo 6º do Art. 177 da nova Lei estabelece: “As companhias fechadas poderão optar por observar as normas sobre demonstrações financeiras expedidas pela Comissão de Valores Mobiliários para as companhias abertas.”

A partir dessa possibilidade, introduzida pela Lei, empresas estatais federais 100% públicas, ou seja, de capital fechado, como os Correios, BNDES e a própria Caixa, passam a adotar, especificamente, uma das normas da CVM, a deliberação nº 371/00.

Em 2000, quando foi expedida essa deliberação, ainda não havia sido criado o CPC, que surge em 2005, mas o Brasil já vinha, desde os anos 1990, se adequando às normas internacionais com a abertura de sua economia e se integrando ao processo de globalização. Por essa época a entidade que cumpria o papel hoje desempenhado pelo CPC era o Instituto dos Auditores Independentes do Brasil (Ibracon). A deliberação CVM mencionada era a adoção do pronunciamento correspondente à tradução/adaptação da IAS 19 – Employee Benefits (Benefícios a Empregados), posteriormente adotado pelo CPC como CPC 33. Em 2012 o pronunciamento foi revisado e identificado como CPC 33 – R1. A nova versão foi incorporada pela CVM por meio de uma nova Deliberação, a 695/12.

Resolução 4.424/2015 do Banco Central

Em junho de 2015 o Banco Central expede a Resolução 4.424, cujo teor de seu artigo 1º é: “As instituições financeiras e as demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil devem observar, a partir de 1º de janeiro de 2016, o Pronunciamento Técnico CPC 33 (R1) – Benefícios a Empregados (CPC 33), aprovado pelo Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC), em 7 de dezembro de 2012.” A partir dessa resolução, o que era facultativo à Caixa, adotado por discricionaridade de seus dirigentes e controladores, passa a ser obrigatório.

Pretensamente, até pela forma “solene” com que o BC se refere ao CPC 33, a aplicação da norma representaria uma maior segurança ao Sistema Financeiro. Mas analisando de modo mais profundo, fica claro não haver nenhuma vantagem operacional para qualquer empresa em lançar, no presente, despesas que seriam diferidas ao longo de varios anos. Essa prática, na verdade, pode comprometer o desempenho das empresas e impactar negativamente a economia do país.

Não se faz provisionamento para outras despesas ordinárias como por exemplo o gasto futuro com consumo de energia, ou pagamento de locação de imóveis onde funcionam agências e outras áreas, ou mesmo para pagamento de salários. São despesas correntes que serão custeadas com as receitas de cada exercício.

Importante registrar que o BC determina o cumprimento de outros pronunciamentos do CPC, os quais não pretendemos entrar no mérito neste artigo. Pretendemos apenas analisar o impacto e a utilidade do CPC 33 do ponto de vista da empresa e dos que a ela se vinculam ou dependem dela como fomentadora de desenvolvimento social, como os empregados e a população em geral; e tentar desvendar qual o interesse real por trás dessa obrigação.

[1] http://www.cpc.org.br/CPC/CPC/Conheca-CPC (acessado em 02/06/2021)

 

[2] https://www.blbbrasil.com.br/blog/ifrs-o-que-sao/ (acessado em 02/06/2021)

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