Quando a primeira onda da pandemia chegou, o movimento sindical exigiu a suspensão da cobrança de metas na CAIXA. O objetivo era garantir a prioridade no atendimento aos clientes e beneficiários de programas sociais, diante do previsível caos social que se abateria sobre os trabalhadores brasileiros. Durante os cerca de seis meses em que as metas foram suspensas, toda a energia dos trabalhadores da CAIXA voltou-se para garantir o atendimento, principalmente do Auxílio Emergencial. Os bancos privados, por sua vez, cumpriram a sua ética: maximizar lucros não combina com ações sociais, de forma que a CAIXA pagou sozinha o Auxílio Emergencial.
Durante esse período sem “conquiste.caixa”, agências que tinham quantitativo de colegas insuficiente para garantir o atendimento (afastamentos para isolamento de grupos de risco, férias, licenças médicas etc.) recebiam reforços de outras unidades. A cooperação entre as agências ocorria de forma natural, na expectativa de garantir um mínimo de qualidade de atendimento aos correntistas e à fila do Auxílio Emergencial.
Assim que a cobrança de metas de vendas retornou, a solidariedade – por força de gestão – foi suspensa. A capacidade de ajudar a agência vizinha acaba quando uma lista interminável de itens a serem vendidos passa a ser a prioridade: seguro de vida, seguro prestamista, seguro de acidentes pessoais, seguro residencial, previdência privada, capitalização, cartão de crédito, credenciamento. Os gerentes deixaram de atender as filas. Passaram a ligar para seus clientes e oferecer os produtos. Era essa a diretriz.
Como nenhuma instituição financeira do mundo teria capacidade de atender a 100 milhões de pessoas ao mesmo tempo, a CAIXA perdeu muitos clientes, dada a grande dificuldade para o atendimento. Com a automatização do pagamento do Auxílio Emergencial – depois com o seu fim – a expectativa era de que o atendimento ficasse mais ágil e melhor. Porém, o efeito meta seguiu produzindo filas, já que boa parte da força de trabalho não atende o público.
Vivemos a tempestade perfeita na CAIXA: efeito da avalanche pandêmica, descaso com o atendimento gerado pela cobrança de metas altíssimas, escassez estrutural produzida pelo enxugamento do quadro funcional, restruturações internas. Resultado: perda monumental de recursos em contas correntes e aplicações financeiras e a redução estrutural da participação no mercado de crédito, principalmente em pessoa jurídica. Esse vai pelo visto ser o legado dos anos da gestão Pedro Guimarães, que tenta esconder esse fracasso alardeando a abertura de milhões de contas de poupança digital – cujo saldo, via de regra, é zero. Aliás, a importante bancarização de pessoas excluídas do sistema – construída com suor e sangue de funcionários da CAIXA em 2020 e 2021, não pode servir de instrumento para a privatização da poupança da CAIXA, como quer Pedro Guimarães, através da criação do Banco Digital.
Enquanto a CAIXA perde market share, a terceira onda da COVID, com a variante Ômicron, fecha as agências de maior fluxo (geralmente aquelas de periferia e interior) enquanto as agências localizadas em bairros ricos têm surtos menos frequentes, gerando novo caos de atendimento. Ao solicitar socorro, alguns Gerentes Gerais de Rede têm escutado a resposta de que nada pode ser feito, já que nenhuma unidade se dispõe a ceder funcionários – afinal há metas de vendas para cumprir. E, mesmo após a desinfecção protocolar, houve inúmeros casos em que a agência seguiu fechada por insuficiência de atendentes. Depois, com a agência fechada, a cobrança por metas continua, com vários casos de assédio reportados, inclusive com perseguição de pessoas que denunciavam a situação. Pedro Guimarães, insatisfeito em ceder à concorrência de Bradesco, Itaú e XP, fomenta a concorrência e o canibalismo entre funcionários da CAIXA.
Outro modelo é possível. Quem põe a mão na massa é que pode construí-lo
A suspensão imediata das metas de vendas até o fim da pandemia abrirá espaço para discutirmos o papel das metas. A individualização das metas – por CPF, como defende o modelo de verticalização de resultados – além de obstruir a cooperação entre o corpo funcional, fomenta práticas antiéticas ou até mesmo ilegais, como a venda casada e o assédio moral na cobrança de vendas.
Defendemos que as empresas estatais devam ter objetivos expressos em metas coletivas, para direcionar os esforços da instituição rumo ao bem estar da sociedade brasileira e também de resultados financeiros éticos baseados na satisfação do público atendido.
Metas realmente relevantes, como financiamento a habitações populares, saneamento, eficiência no pagamento de benefícios, qualidade de atendimento e alinhamento de produtos e serviços às reais necessidades do cliente são ignoradas – enquanto as chefias cobram a informação de quantas capitalizações o bancário vendeu no final do dia.
Qual será a última gota d’água que transbordará a paciência do bancário da CAIXA para fazermos uma grande greve e pautar esta e outras questões?