O Setembro Amarelo foi adotado no Brasil em 2015, com o objetivo de promover esclarecimentos para prevenir um problema que aflige milhões de pessoas em todo o mundo e, particularmente no Brasil, tratado como tabu, o suicídio. Essa inciativa coube ao Centro de Valorização da Vida (CVV), ao Conselho Federal de Medicina (CFM) e à Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP)
Inspirado na história de um jovem de 17 anos, nos Estado Unidos, que pôs fim à vida em setembro de 1994, chamado Mike Emme, mas a família nunca tinha observado que sofria de depressão. Mike era apaixonado por carros antigos e possuía um Mustang 1968 amarelo, por isso seus amigos compareceram ao velório usando fitas amarelas.
A Organização Mundial da Saúde (OMS), afirma, com base em suas pesquisas, que a cada 40 segundos ocorre um suicídio em algum lugar do mundo. No Brasil acontecem mais de 13 mil casos todos os anos.
A partir dos anos 1990, especialistas, como o brasileiro Marcelo Finazzi, doutor em administração pela Universidade de Brasília (UnB), começaram a estudar um fenômeno novo, o aumento de casos nos ambientes de trabalho. Empregado de carreira do Banco do Brasil, Finazzi construiu sua tese de doutorado com base na epidemia de suicídios no banco naquela década. Com a abertura de um plano de demissão voluntária (PDV) em 1996, uma das medidas de reestruturação da empresa, o quadro se agravou significativamente.
A administração do banco, com o objetivo de reduzir a folha de pagamento para favorecer a política de privatização, durante o governo de FHC, passou a pressionar os trabalhadores, por meio de assédio moral, a aderirem ao PDV. Os que resistiam sofriam todo tipo de perseguição, inclusive com transferência de local de trabalho para outros estados e perda de função. O levantamento feito por Finazzi revela que em média, entre 1993 e 2005, pelo menos um bancário cometeu suicídio a cada 20 dias.
Na Europa, um dos trabalhos mais referenciados é do psiquiatra e psicanalista francês, Christophe Dejours, estudioso da Saúde do Trabalhador e criador da teoria da psicodinâmica do trabalho, tendo publicado vários livros. O médico lança um desafio às empresas que, em sua totalidade, buscam fugir à responsabilidade por essa grave situação alegando serem essas pessoas portadoras de problemas mentais não relacionados ao trabalho. Dejours indaga “por que razão os trabalhadores buscariam atentar contra a própria vida justamente no local de trabalho? Essa é uma mensagem terrível a ser decifrada.”
Na Caixa o suicídio também passou a ser uma realidade por motivos semelhantes ao que ocorreu no BB. O aumento da pressão por produtividade e as perseguições praticadas por gestores despreparados e fiéis às diretrizes das administrações superiores, levaram diversos colegas a tirarem a própria vida, em sua maioria, nos ambientes de trabalho.
Recentemente, durante o momento de maior repercussão da demissão do ex-presidente Pedro Guimarães, em razão da prática de assédio sexual, em que molestou dezenas de empregadas, as quais apresentaram denúncia junto ao Ministério Público do Trabalho, e assédio moral generalizado, um executivo foi encontrado morto no pátio da Matriz em Brasília. As investigações concluíram tratar-se de mais um caso de suicídio na empresa.
Pesquisa realizada em janeiro deste ano pela Diretoria de Saúde e Previdência da Fenae indica que a pressão, a ansiedade e a impossibilidade de superar dificuldades no trabalho é um sentimento contínuo ou frequente para 50% dos bancários da ativa; 65% dos entrevistados afirmam conhecer algum colega passando por sofrimento contínuo, tal como depressão, angústia, pânico, causados pelo ambiente de trabalho; 75% dos que adoeceram no ano anterior, reportaram como causa problemas de saúde mental; 74% já testemunharam a ocorrência e 64% já sofreram assédio moral na empresa. Em outro levantamento realizado em 2018 pela Fenae, 46,9% dos entrevistados afirmaram ter conhecimento de casos de suicídio na empresa.
O suicídio é uma tragédia evitável, mas demanda um esforço conjunto. Pessoas comuns podem ajudar na prevenção, observando o comportamento de familiares e amigos ouvindo, dando apoio e orientação para a procura de profissionais e instituições especializadas, mas falta política com estratégias integrativas que englobem o trabalho no nível individual, de sistemas e da comunidade.
Já o combate ao suicídio no trabalho incorpora um elemento a mais: a necessidade de controle sobre as formas de exploração capitalista, intensificada com a introdução do neoliberalismo. O aprofundamento dos métodos de obtenção de lucro a qualquer custo, gerando pressão por produtividade, assédio moral, captura da subjetividade, individualismo, quebra da solidariedade entre trabalhadores, com a desvalorização do trabalho em equipe e o estímulo à competição, produz um ambiente propício ao aparecimento do sofrimento mental.
Esse quadro exigiria a adoção de uma política governamental intersetorial que obrigasse as empresas a abdicarem de tais mecanismos e promoverem ambientes laborais livres de fatores de risco, em especial, à saúde mental. Por outro lado, é necessária uma melhor compreensão dos próprios trabalhadores e principalmente de suas entidades representativas da importância central do tema Saúde do Trabalhador, o qual está na raiz da exploração do trabalho e somente com o envolvimento dos trabalhadores organizados coletivamente com o apoio de seus representantes o problema será superado.