Previdência e Saúde

Assédio moral, sexual, constrangimentos, pressão no trabalho: o que tudo isso tem a ver com depressão e suicídio?

O mês de setembro já chega praticamente a seu fim e com ele o período em que se faz a lembrança e o alerta quanto aos altos índices de suicídios no Brasil e em todo o mundo, conhecido como “Setembro Amarelo”.

Contudo, não cessa a necessidade de reflexão e de denúncia sobre as razões que levam pessoas a atentar contra a própria vida, em especial, quando o ato, possivelmente na tentativa de deixar uma pista, é praticado no ambiente de trabalho ou em suas proximidades; e deve continuar durante todo o ano para pressionar por medidas preventivas e pelo abandono de determinados modelos de gestão, como forma de reduzir essa trágica estatística.

Isso torna forçoso lembrar a última situação de que se tem notícia, entre muitas, ocorrida na Caixa. Trata-se do caso do diretor Sérgio Ricardo Faustino Batista, cujo corpo sem vida foi encontrado na noite de 19 de julho, no pátio da Matriz em Brasília, logo após a emersão do, talvez, maior escândalo já revelado nos bastidores da empresa, a denúncia da prática de assédio sexual e moral pelo ex-presidente, de infeliz memória, Pedro Guimarães.

Embora bastante obscuro, a versão oficial da conta de ser mais um caso de suicídio nas dependências da empresa. As denúncias internas contra o então presidente, antes de as colegas vítimas de sua perversão as levar ao Ministério Público do Trabalho (MPT), eram recebidas pela área de Controles Internos e Integridade da Caixa sob responsabilidade do executivo desaparecido, tendo o fato de sua morte ocorrido a pouco mais de 20 dias após a demissão do chefe maior, propiciando o surgimento de teorias da conspiração bastante razoáveis, em especial, nos tempos atuais em que estranhas coincidências acontecem com frequência nas esferas de poder. Mas, claro, são apenas suposições.

De todo modo, do ponto de vista do impacto causado nos colegas e familiares, saber exatamente a razão da morte é menos importante. Qualquer das possibilidades é absolutamente chocante e a tragédia, certamente, poderia ter sido evitada, independentemente de sua causa real.

Exemplos à parte, entre as questões suscitadas pelo “Setembro Amarelo”, uma é bastante intrigante: por que já há alguns anos têm acontecido tantos suicídios nos locais de trabalho? Para responder a isso existem inúmeros estudos acadêmicos os relacionando a prática de pressão psicológica sobre os trabalhadores, cada vez mais comuns nas empresas, normalmente como forma de obtenção da máxima produtividade, mas também por outras razões, como a que culminou com a demissão de Pedro Guimarães. Evidentemente, o autoextermínio está ligado ao sofrimento mental levado a níveis insuportáveis e essas estratégias representam um fator de risco nesses casos.

A violência psicológica nas empresas não é um fenômeno novo e tem estreita relação com a exploração do trabalho. Mas, no Brasil, se intensifica significativamente dos anos 1990 para cá, com a introdução do neoliberalismo e suas “modernas” técnicas de gestão, com incentivo à disputa entre colegas e o céu colocado como limite das metas de produção. Logo, estabelecer relação entre o adoecimento mental, que exacerbado pode levar ao suicídio, e trabalho, não pode ser considerado uma leviandade. Portanto, é fácil concluir que uma das medidas mais eficazes para o combate a esse fenômeno é a promoção de ambientes e relações de trabalho mais humanizados.

A alteração profunda dessa situação não pode prescindir de pelo menos dois elementos: 1) a adoção de uma política de estado que coíba de forma efetiva os abusos praticados pelos patrões, ao deixarem de observar regras básicas de preservação da saúde do trabalhador, na busca de aumento do lucro a qualquer custo; e 2) uma ação sindical enérgica que possibilite e estimule a reação organizada dos trabalhadores contra essas práticas.

Mas, voltando à denúncia de assédio (sexual e moral) de que o ex-presidente da Caixa foi alvo, passados os primeiros dias da ocorrência, o assunto, naturalmente, deixou de frequentar as páginas da imprensa. No âmbito da Justiça e na memória dos empregados da empresa, entretanto, o caso não pode ficar por isso mesmo, sob pena de, em razão da impunidade, servir de estímulo a quem queira, eventualmente, imitar sua má conduta.

Na tentativa de minimizar a repercussão negativa do ocorrido, foi nomeada uma mulher para a vaga deixada por Guimarães, a administradora de empresas Daniela Marques. Isso seria uma boa notícia, não fosse constar de seu currículo o fato de ser pessoa da estrita confiança do ministro da Economia, Paulo Guedes.

Já a demissão, nesse caso, não pode ser entendida como uma punição, mas sim, apenas como a correção de mais uma das muitas atitudes destrambelhadas de Bolsonaro, quando no início de seu (des) governo nomeou Guimarães para o cargo, sabendo de seu histórico de assediador, motivo para sua saída da direção do Banco Santander há alguns anos. Por óbvio, a reincidência era previsível.

Por outro lado, uma punição exemplar é necessária para deixar claro para o público interno e externo, que atitudes como essa não podem ser toleradas, mas também em respeito, principalmente, às colegas vítimas do desvio de caráter do ex-gestor maior da Caixa, e a todos os demais empregados, que direta ou indiretamente foram afetados pelo assédio moral e sexual, não somente praticado, mas também institucionalizado na empresa por seu próprio presidente.

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