Estudo publicado em janeiro pela Oxfam Internacional destaca ao analisar efeitos da pandemia: “Os dez homens mais ricos do mundo dobraram suas fortunas, enquanto mais de 160 milhões de pessoas foram empurradas para a pobreza. Nesse meio tempo, estima-se que 17 milhões de pessoas morreram de Covid-19, uma escala de perda que não era vista desde a Segunda Guerra Mundial“.
Mais riqueza aos mais ricos facilitada com a crise sanitária. Diz a Oxfam que bancos centrais injetaram trilhões em todo mundo para salvar economias, parte dos quais, além de proporcionar a valorização de ações de companhias, passou pelo mercado financeiro e, dele, ao patrimônio de bilionários.
Na lista de beneficiados pela Covid-19 aparecem executivos da farmacêutica BioNTech. Diz o estudo que a empresa, em parceria com a Pfizer, “obteve lucros recordes com sua vacina contra a Covid-19. Com o apoio do investimento público alemão, a BioNTech desenvolveu uma vacina contra a Covid-19 bem sucedida, mas menos de 1% das pessoas que vivem em países de baixa renda tem acesso a ela”. Vacina é negócio de monopólios farmacêuticos, com leis desobrigando-os do amplo fornecimento, independentemente das mortes causadas pelo acesso limitado ao produto. Pfizer/BioNtech e Moderna cobram até 24 vezes o custo estimado de produção por uma dose de vacina.
Mas nem só de vacinas vivem os bilionários.
A Oxfam informa que Elon Musk, empresário nos Estados Unidos e homem mais rico do mundo, “recebeu bilhões de dólares em subsídios governamentais, enquanto violava as leis trabalhistas e minava os esforços de organização dos trabalhadores das fábricas. Em 2018, ele não pagou o imposto de renda”. Gautam Adani, indiano do ramo de combustíveis, “utilizou conexões estatais e se tornou o maior operador de portos do país e seu maior produtor de energia térmica a carvão. Ele exerce o controle de mercado sobre a transmissão de energia, a distribuição de gás e, agora, aeroportos privatizados, todos um dia considerados bens públicos.”
Na crise ou fora dela, o modelo de concentração de riqueza, um dos fundamentos do sistema neoliberal, abre aos ricos oportunidades para redução de alíquotas e da regulamentação fiscal, ao corte de direitos e de salários de trabalhadores, canalizando esforços à privatização de bens públicos. Normaliza, ainda, paraísos fiscais que abrigam fugitivos da tributação, alguns recentemente mencionados pelo Pandora Papers, entre eles os neoliberais Paulo Guedes, Ministro da Economia do governo Bolsonaro, e Roberto Campos Neto, Presidente do Banco Central do Brasil. À exceção do espanto inicial, não houve qualquer consequência.
O patrimônio dos dez homens mais ricos do mundo é maior do que o dos 3,1 bilhões de pessoas mais pobres. Abaixo da linha da pobreza, 5,50 dólares ao dia na medição do Banco Mundial, viviam 3,2 bilhões de pessoas. Com a pandemia, a esse tanto de gente somaram-se outros 163 milhões de pessoas. E, na referência a nosso miserável ambiente caseiro, o estudo da Oxfam revela que no Brasil negros são uma vez e meia mais propensos a morrer de Covid-19 do que os brancos. Aliás, mesmo sem a condenação pela Covid-19, na cidade de São Paulo moradores das áreas mais pobres têm expectativa de vida 14 anos inferior à daqueles das áreas ricas.
Alternativa
A Oxfam sugere a cobrança de imposto único, com alíquota de 99% sobre a elevação de lucros decorrentes da Covid-19 alcançados pelos dez homens mais ricos do mundo. O valor seria destinado a políticas de saúde, mas não apenas: serviria ao financiamento de medidas de proteção ambiental, social e no combate à violência de gênero em mais de 80 países. Os dez homens, ainda assim, ficariam 8 bilhões de dólares mais ricos do que antes da pandemia.
E, além da tributação, os governos também têm que acabar com o monopólio das vacinas. Vacinas devem ser bens públicos de código aberto, defende a Oxfam.
Vai acontecer? Enquanto predominar a ótica neoliberal, provavelmente não.
A íntegra do estudo está disponível em
https://www.oxfam.org.br/justica-social-e-economica/forum-economico-de-davos/a-desigualdade-mata/