ArquivosCaixaPrevidência e Saúde

CPC 33, o início do fim do Saúde Caixa e dos planos Funcef (parte I)

CPC 33, o início do fim do Saúde Caixa e dos planos Funcef (parte I)

O texto a seguir é o primeiro de uma série de 4, abordando uma das questões centrais que explicam o interesse da Caixa e do governo federal em se desonerar do patrocínio de duas das mais importantes conquistas dos empregados, o Saúde Caixa e os planos da Funcef, os assim chamados “benefícios pós emprego”, que significam os direitos dos empregados que se estendem após a aposentadoria. Trata-se de uma norma contábil conhecida como CPC 33, cujo teor é um tanto complexo, mas nossa intenção com essa série de artigos não é nos prendermos demasiadamente aos aspectos técnicos, e sim tentarmos desvendar as razões políticas e os interesses por trás do cumprimento dessa norma pela Caixa.

 Primeiras investidas da empresa contra o Saúde Caixa

Desde o fechamento da Campanha Salarial de 2018 o Saúde Caixa passou a correr risco concreto de extinção, uma vez que o Acordo Coletivo de Trabalho (ACT) assinado entre a Contraf e a Caixa, já trazia a imposição do teto de contribuição por parte da patrocinadora de 6,5% da folha de pagamento dos ativos somada à folha de proventos da Funcef.

Não que anteriormente não houvesse ameaças nesse sentido. Desde o final de 2016, logo após a assinatura do ACT daquele ano, que mantinha o modelo original de custeio do Saúde Caixa com os custos assistenciais sendo repartidos na proporção de 30% para os empregados e 70% para a Caixa, e 100% de todos os demais arcados pela empregadora, a direção da empresa pressionava pela alteração do instrumento coletivo, com o objetivo de incluir a previsão do teto. Porém negociações nesse sentido não avançaram e a garantia foi mantida durante toda a vigência do ACT, até 31/08/2018, quando, na campanha salarial, os dirigentes da Contraf, avaliando equivocadamente a disposição de enfrentamento dos empregados, concluíram que o movimento não teria forças para resistir às investidas da empresa e aceitaram a imposição do teto, entre outros retrocessos como a exclusão dos empregados admitidos a partir de 01/09/2018 no plano.

Mas qual era, afinal, o interesse da patrocinadora em alterar um modelo de custeio que demonstrou ao longo de seus 14 anos de existência, ser, não só sustentável, como inclusivo, pois, pelos princípios de socialização dos custos e do pacto intergeracional, todos os empregados tinham condições de contribuir de acordo com suas respectivas rendas e usufruir dos serviços do plano de forma indistinta?

Múltiplos fatores respondem a essa pergunta, mas, certamente, o principal deles é o cumprimento pela Caixa de uma norma de contabilização, o CPC 33, denominada “Benefícios a Empregados”, fazendo com que a empresa, em seu balanço patrimonial, seja obrigada a provisionar altos valores correspondentes à despesas futuras com o pagamento de direitos aos empregados (ativos e aposentados) – à exceção dos salários encargos e outras verbas habituais –,  principalmente após a aposentadoria, sendo os planos da Funcef e o Saúde Caixa os principais, por envolverem maiores volumes financeiros. Com a aplicação do teto há significativa redução desse provisionamento, pois cria a perspectiva de reduzir de forma drástica, nos anos futuros, os gastos com o plano, podendo até zerá-los. Mas, como veremos, a imposição do CPC 33, principalmente para a Caixa, uma empresa 100% pública, é bastante questionável.

Funcef também na mira

Com o mesmo objetivo, mas adotando estratégia diferente, a Caixa busca também se desonerar da participação financeira nos planos de previdência fechada, assim como as demais empresas estatais. Com essa finalidade diversas alternativas têm sido buscadas, uma delas foi o PLP 268/2016, que pretendia introduzir diversas alterações na Lei 108/2001, que regula os fundos de previdência privada fechados, como por exemplo excluir a representação dos participantes nas instâncias de poder (conselho deliberativo, conselho fiscal e diretoria executiva) das administradoras desses fundos; possibilidade de retirada de patrocínio pelas empregadoras e transferência da gestão para empresas de mercado, normalmente ligadas a bancos privados; entre outras mudanças.

Pressão junto ao parlamento culminou com a apresentação de um substitutivo que eliminou os principais ataques contidos no PLP. Porém as ameaças não pararam por aí, como é o caso da Resolução CGPAR 25/2018, abordada mais adiante.

Direitos dos aposentados: a pedra no sapato do mercado

Os ideólogos do “livre mercado” que adoram alardear os compromissos sociais das empresas privadas para promover suas imagens, mas cujo único objetivo é garantir altas rentabilidades aos grandes acionistas das bolsas de valores, elegeram seus maiores inimigos: os aposentados.

Para eles os chamados “benefícios pós emprego” são o grande ralo que drena os recursos das companhias e faz com que os dividendos pagos a acionistas sejam menores do que deviriam ser, segundo suas visões mesquinhas. Porém, os valores relativos às contribuições da empresa, seja para planos de saúde, seja para fundos de previdência privada, têm caráter de salário indireto e já estão computados como despesa de pessoal mensalmente desde a contratação dos empregados, portanto, sua retirada ou redução representa, na prática, redução salarial, ou seja, um mecanismo de transferência de renda de trabalhadores para investidores em bolsas de valores, nacionais e internacionais.

O CPC 33, embora seja denominado “benefícios a empregados” é focado em eliminar os direitos dos aposentados (pós emprego), que normalmente dedicaram as vidas inteiras ao crescimento das empresas, muitos, inclusive, com o comprometimento da própria saúde.

Isso não significa que reduzir custos com empregados ativos, para tornar as instituições públicas ainda mais atraentes ao mercado, não seja também algo ambicionado. Mas há mecanismos “mais sutis” na legislação que permitem outras formas de fazer, no limite, com demissão em massa pura e simples, ou por meio de PDV, de empregados antigos, contratando novos sem tais direitos.

Com os aposentados isso se torna mais difícil, pois retirar direitos consagrados pode gerar arriscadas demandas judiciais, assim, a solução mais segura é não permitir que os direitos da ativa sejam estendidos aos aposentados, o que já vem sendo feito na Caixa desde o ACT 2018/2020, que impediu os contratados a partir de 01/09/2018 de aderirem ao plano de saúde. Em 2020 o ACT passou a permitir sua inclusão, porém sem direito na aposentadoria.

Qual é a sua reação?

Animado(a)
0
Gostei
2
Apaixonado
0
Não gostei
0
Bobo(a)
0

Você pode gostar

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Mais em:Arquivos