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CPC 33, o início do fim do Saúde Caixa e dos planos Funcef (parte III)

Este é o terceiro artigo da série sobre a aplicação do CPC 33 para as empresas públicas, em especial as fechadas, como a Caixa. Conheçam também as parte “I” e “II” desse artigo publicadas neste espaço.

(https://agoraeparatodos.com.br/cpc-33-o-inicio-do-fim-do-saude-caixa-e-dos-planos-funcef-parte-i/)

CPC 33, o início do fim do Saúde Caixa e dos planos Funcef (parte II)

 

Impactos da aplicação do CPC 33

Uma versão inverossímil utilizada com frequência internamente na Caixa, para explicar a pretensa utilidade dessa norma, seria a garantia para os trabalhadores de que, no futuro, se a empresa não tiver condições de honrar os compromissos com os trabalhadores no patrocínio dos planos de saúde e de complementação da aposentadoria, os valores provisionados seriam utilizados para esse fim, mas o pronunciamento CPC 33 não faz referência a isso.

Mesmo que fizesse de forma explícita, seria totalmente inócuo. No caso do Saúde Caixa, mantida a regra do teto de 6,5% das folhas de pagamento dos ativos somada à de proventos da Funcef, a Caixa rapidamente irá transferir a maior parte do custo para os empregados. O índice que mede a chamada inflação médica, a Variação do Custo Médico Hospitalar (VCMH), cresce de três a quatro vezes acima do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), referência para os reajustes salariais e de proventos, fazendo com que a cada ano a participação da Caixa seja menor relativamente ao custo assistencial e, consequentemente, a dos empregados mais elevada, até o ponto em que a maioria não suportará mais pagar as mensalidades e desistirão do plano. Assim a Caixa não poderá ser acusada de não oferecer assistência à saúde, os empregados é que optam por não aderir a ela.

Em relação aos planos da Funcef, fica claro que cada vez mais se buscará mecanismos para reduzir a responsabilidade das empresas por meio de modificações na legislação, como foi o caso do PLP 268/16 e por normas infralegais, como a CGPAR 25 , que detalharemos no quarto e último artigo desta série, mas antecipamos aqui uma das regras previstas, qual seja, a proibição de constar no regulamento dos planos qualquer referência a percentuais obrigatórios de contribuição das empregadoras.

Na verdade, a consequência prática do provisionamento previsto no CPC 33 para as empresas, é o contingenciamento do capital disponível para suas operações fim, comprometendo parte de seu resultado e limitando sua ação institucional, portanto, para elas, empregados e população, melhor seria não fazer.

Utiliza-se uma lógica invertida para justificar a necessidade de reduzir os direitos dos trabalhadores, dizendo que os planos de saúde e de previdência comprometem o desempenho da empresa, pois a obriga a cumprir o CPC 33. Mas na verdade esse pronunciamento foi criado para dificultar a concessão das reivindicações dos trabalhadores. Outro efeito do provisionamento é reduzir o valor patrimonial das empresas. E qual o sentido de isso ocorrer se o custo desses direitos já compõe seus balanços e, portanto, no computo dos resultados operacionais e no cálculo do valor de mercado essas despesas já são consideradas.

Existe grande chance de, após a venda de um lote de ações no mercado com valores reduzidos na proporção dos provisionamentos porventura ainda existente, esses direitos serem extintos, face a tendência crescente de flexibilização da legislação, assim os valores provisionados serão liberados. Com isso as ações da empresa serão valorizadas e os acionistas ganharão duas vezes: na compra, por terem tido o desconto em decorrência do provisionamento e quando o provisionamento é liberado com a extinção do direito.

Aliás, o argumento utilizado pela Caixa para pressionar pela mudança no modelo de custeio (70/30) do Saúde Caixa em 2017 era de que o valor do provisionamento do plano em 30/06 atingia a casa dos R$ 14,5 bilhões (ver quadro abaixo) e as projeções para 31/12 daquele ano indicavam um número próximo a R$ 17 bilhões, reduzindo nesse montante seu capital e seu patrimônio líquido (PL), com potencial para comprometer sua atuação de mercado a partir de 1º de janeiro de 2019, pois a desenquadrava de uma das regra do Acordo da Basileia 3, de que a razão entre o total das operações de crédito dos bancos e seu Patrimônio de Referência (PR) não pode ser inferior a 13.

Mas qual a real finalidade do pronunciamento CPC 33?

O objetivo da IAS 19/CPC 33, assim como de todas as demais normas de “harmonização contábil” é obrigar as empresas a seguir parâmetros internacionais para a abertura de capital em bolsas de valores, nacionais ou estrangeiras, como fica patente no 2º artigo desta série, em que reproduzimos trecho de texto publicado no sítio da internet de uma instituição especializada na área.

No caso específico do CPC 33, fazendo com que o valor de uma empresa no mercado de ações seja reduzido na proporção do custo anual dos chamados “benefícios a empregados”, que, em última análise, nada mais são do que salários indiretos, desestimulando-as a ceder às reivindicações dos trabalhadores por melhores contrapartidas às obrigações previstas nos contratos individuais de trabalho.

Costuma-se chamar essa finalidade, hipocritamente, de “transparência”, com isso justificam a redução da participação no custeio dos planos de saúde e de previdência privada. Criando assim, um falso dilema para os empregados: é preferível renunciar aos direitos para “salvar” a empresa, ou lutar pela manutenção dos direitos e correr o risco de levar a empresa à “insolvência”? E aí se torna inevitável a pergunta retórica: a quem, afinal, interessa a abertura do capital de empresas 100% públicas, que prestam valorosos serviços à população e são altamente rentáveis?

Frise-se, a aplicação do CPC 33 tem sido usada como justificativa para o ataque às conquistas de todos os trabalhadores das estatais federais, sejam elas fechadas como Correios, Embrapa e Caixa ou abertas, como Petrobrás, Banco do Brasil etc. As medidas adotadas pelas direções e controladores das empresas, no entanto, diferem de acordo com as características de cada uma delas, mas planos de saúde e de previdência privada são os principais alvos, no intuito de tornar as instituições mais atraentes no atual processo de entrega do patrimônio público à inciativa privada nacional e internacional.

Os números são eloquentes

A tabela abaixo mostra a evolução dos valores provisionados pela Caixa para o Saúde Caixa e Funcef/Prevhab em seus balanços anuais desde a adoção do Pronunciamento Contábil Benefícios a Empregados.

EVOLUÇÃO DO PROVISIONAMENTO CPC 33 (PÓS EMPREGO)

2008 A 2020

Data Saúde Caixa (R$ mil) Funcef/Prevhab

(R$ mil)

Aux. Alim./Cesta p/aposentados (R$ mil) Totais

(R$ mil)

31/12/2008 4.234.482 42.680* 712.423 4.989.585
31/12/2011 5.169.596 43.635* 626.970 5.840.201
31/12/2013 9.346.949 1.456.982 861.147 11.665.078
31/12/2015 12.068.398 2.579.005 1.097.455 15.744.858
31/12/2016 13.541.691 7.942.887 1.331.503 22.816.081
30/06/2017 14.496.623 8.840.498 1.376.451 24.713.572
31/12/2017** 10.122.889 10.729.548 1.422.383 22.274.820
31/12/2018 9.916.674 11.743.712 1.605.080 23.265.466
31/12/2019*** 12.404.759 15.640.675 1.844.692 29.890.126
31/12/2020 12.066.053 14.437.260 2.003.798 28.507.111

Fonte: Balanços Caixa

* Não havia ainda provisionamento para os planos da Funcef, o montante se refere apenas à Prevhab

**Mudança de premissa para o cálculo atuarial do provisionamento do Saúde Caixa com base na previsão de utilização do teto de 6,5% da FP e folha de proventos para contribuição da Caixa a partir da alteração estatutária de DEZ/17

***Revisão para baixo da taxa de desconto para obtenção do valor presente em razão da redução da taxa Selic

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