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CPC 33, o início do fim do Saúde Caixa e dos planos Funcef (PARTE IV)

Este é a quarta e última parte da série sobre as razões e os impactos do cumprimento da norma CPC 33 pela Caixa, tanto para a empresa quanto os empregados e a população. Os três artigos anteriores foram publicados, é importante conhecê-los também. (link)

 Resoluções CGPAR 22, 23 e 25

Em janeiro de 2018 a Comissão Interministerial de Governança Corporativa e de Administração de Participações Societárias da União (CGPAR) – órgão do governo federal que acompanha a gestão das empresas estatais, suas subsidiárias e controladas e demais sociedades em que a União, direta ou indiretamente, detenha a maioria do capital social com direito a voto –, expediu as Resoluções 22 e 23, com o objetivo de estabelecer limites para a participação financeira delas nos planos de saúde de autogestão de seus empregados.

De acordo com essas resoluções as empresas devem implantar até janeiro de 2022 todos os itens recomendados, conforme segue:  1) adoção de limite de participação financeira da empresa à percentual da folha de pagamentos somada à folha de proventos dos aposentados; 2) contribuição da empregadora não superior à contribuição dos empregados, considerando todos os custos, assistenciais e não assistenciais; 3) novos planos de autogestão por RH não poderão ser criados, como é o caso do Saúde Caixa, em que não existe operadora com personalidade jurídica própria, a gestão é feita pela própria empregadora e a ANS a considera como operadora por RH; 4) não concessão do plano com participação no custeio pela empresa na aposentadoria (pós-emprego), respeitado o direito adquirido; 5) contribuição individual por dependente, vedada a cobrança única por grupo familiar; 6) cobrança diferenciada por faixa etária, os mais idosos pagam mais; 7) não inscrição de novos dependentes indiretos pais sem renda e filhos maiores de 24 anos; 8) não inclusão de direito à assistência à saúde nos editais de concursos públicos; 9) extinção de planos com menos de 20 mil vidas; e 10) não detalhamento das regras de assistência à saúde nos acordos coletivos de trabalho.

No caso do ACT 2020/2022 da Caixa, à exceção da cobrança por faixa etária, todos os demais itens que se aplicam ao Saúde Caixa, já estão previstos. É possível, no entanto, pela forma como as últimas negociações vêm ocorrendo, com as regras sendo impostas pela empresa, que a partir do próximo acordo a cláusula fique resumida a um único item: “A Caixa assegurará assistência à saúde a seus empregados de acordo com regras estabelecidas por ela.”, conforme prevê o Art. 15 da Resolução CGPAR 23/18, a seguir reproduzido: “As empresas estatais federais que possuam o benefício de assistência à saúde previsto em Acordos Coletivos de Trabalho ­ ACT deverão tomar as providências necessárias para que, nas futuras negociações, a previsão constante no ACT se limite à garantia do benefício de assistência à saúde, sem previsão de qualquer detalhamento do mesmo.” (item 10 acima). Mas caso isso não aconteça, a Caixa poderá, não apenas manter todos os itens prejudiciais ao plano e, por consequência, aos empregados, impondo ainda a cobrança por faixa etária, como sinalizou fazer na campanha 2020, mas recuou.

Em 06 de dezembro de 2018, foi a vez da CGPAR estabelecer, por meio da Resolução 25, as limitações às empresas no patrocínio dos planos de complementação de aposentadoria. A norma determina: 1) novos planos a serem criados somente poderão ser na modalidade de contribuição definida (CD); 2) fechamento dos planos de benefício definido (BD) a novas adesões; 3) alteração dos regulamentos dos planos de benefícios, observando as seguintes regras: a) exclusão de dispositivos que indiquem percentuais de contribuição da empresa; b) adoção da média de, no mínimo, os últimos trinta e seis salários de participação como a base para o cálculo do salário real de benefício da complementação/suplementação de aposentadoria por tempo de contribuição/serviço; c) adoção de teto para salário de participação não superior à maior remuneração de cargo não estatutário da empresa patrocinadora; d) desvinculação do reajuste dos benefícios dos assistidos do reajuste concedido pelo patrocinador aos seus empregados; e) vinculação do reajuste dos benefícios dos assistidos ao índice do plano; f) desvinculação dos valores de complementações/suplementações de aposentadorias do valor do benefício pago pelo RGPS; e g) vinculação dos valores de complementações/suplementações de aposentadorias a valor de RGPS hipotético; 4) percentual máximo de contribuição das empresas aos planos de benefícios em 8,5% da folha de salários de participação; e 5) possibilidade do Conselho de Administração (CA) da patrocinadora determinar a transferência de gerenciamento dos planos da entidade de previdência fechada para administradoras de mercado. Uma sentença judicial, no entanto, impede a aplicação das determinações da CGPAR 25 aos planos da Funcef.

Conclusão

Da análise detida das resoluções CGPAR afetas aos planos de assistência à saúde e de previdência fechada fica claro que, para além de adequá-los a fim de reduzir os provisionamentos determinados pelo CPC 33, como forma de favorecer acionistas privados, a pretensão do governo é igualmente privilegiar o mercado na outra ponta.

No caso dos planos de saúde, inviabilizando as autogestões, para abrir um novo nicho de exploração às operadoras de saúde de mercado, com aproximadamente 5 milhões de vidas, cujos titulares mantém condição financeira mais estável, por serem empregados de empresas públicas e estarem menos sujeitos ao desemprego.

Relativamente aos fundos de previdência privada fechados, entregando de mão beijada um patrimônio da ordem R$ 1 trilhão, pertencente aos trabalhadores, às administradoras, vinculadas a grandes bancos privados, para gerirem da mesma forma que o fazem com os planos abertos, retirando altos lucros, pagando valores baixos de benefícios e sem garantia vitalícia na aposentadoria dos empregados.

Lamentavelmente a Contraf e as entidades ligadas a ela não perceberam armadilha, se deixando levar pela narrativa falaciosa de que o Saúde Caixa era responsável por descapitalizar a empresa, e talvez, não tenham conseguido dimensionar o quanto o plano de saúde é caro ao conjunto dos empregados, e certamente, uma vez estimulados pelas entidades representativas, se disporiam ao enfrentamento com a administração da empresa e do governo para garantir seu direito a uma assistência à saúde digna e sustentável. O discurso desses dirigentes era de que cumprir o CPC 33 era uma imposição legal e por isso seria necessário reduzir o custo do plano para a empresa, pois os altos valores provisionados ameaçavam capacidade operacional dela, comprometendo seu papel social e fragilizando-a no debate da privatização. Como se os trabalhadores fossem os responsáveis pela gestão da empresa e pela política entreguista do governo, à semelhança do que se faz hoje com o funcionalismo público na PEC 32 da reforma administrativa.

Se ao contrário tivessem mantido uma postura afirmativa de que o modelo sustentável do plano era inegociável e feito o correto debate com os empregados, esclarecendo que a real finalidade da aplicação do CPC 33 para a Caixa era justamente adequá-la ao projeto de privatização e abrir mão de conquistas é que enfraqueceria a empresa, certamente todos entenderiam a necessidade da mobilização para a defesa do plano. Lembremos que tínhamos tempo para a construção de um processo de resistência, pois estávamos no início de 2017 e nosso ACT garantia o modelo do plano até 31/08/2018.

O recuo demonstrado naquele momento fortaleceu a posição da empresa favorecendo a ameaça a outros direitos, como no caso dos planos da Funcef, com a mudança do estatuto de forma arbitrária, barrada provisoriamente por liminar, e da tentativa de inviabilizar a eleição dos empregados para os órgãos de gestão adiando-a por mais de um ano.

O modus operandi utilizados no plano de saúde e nos planos de complementação de aposentadoria diferem entre si, mas o intuito é idêntico. No primeiro caso, como a gestão é feita diretamente pela Caixa e o Saúde Caixa consta no ACT, as ações foram mais concentradas nos momentos das campanhas salariais. Já quanto aos planos da Funcef, ela age indiretamente por meio das instâncias da Fundação, onde, desde 2014, os representantes eleitos não têm primado pela defesa dos participantes e as alterações impostas pela empresa passam ao largo da mesa de negociação, sem que as entidades representativas se esforcem para interferir no que ocorre por lá.

Evidentemente, cada empresa, seja aberta ou fechada, possui suas especificidades e, por isso, as estratégias utilizadas também variam de uma para outra, porém os objetivos são os mesmos, entregar ao mercado empresas robustas e rentáveis por um precinho camarada. E em todas elas o CPC 33 é utilizado de duas formas, de um lado pressionando os trabalhadores no intuito de enxugar as estruturas das companhias reduzindo, o quanto for possível as despesas com o “pós emprego” antes de vende-las, para torná-las ainda mais atraentes ao mercado. Sobre a parte que eventualmente não se conseguir eliminar, haverá os provisionamentos que reduzirão os valores de mercado, barateando suas ações em bolsa. Uma vez privatizadas, torna-se mais fácil eliminar os direitos dos trabalhadores, reduzindo o provisionamento e revalorizando as empresas. Certamente um excelente negócio, mas não para o país.

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