Hoje, 10 de outubro, é o “Dia Mundial da Saúde Mental”. Neste ano, a Organização Mundial da Saúde (OMS) e a Organização Panamericana de Saúde (OPAS), colocam no centro do debate uma questão fundamental: a saúde mental como direito humano.
Desde a primeira metade do século XX, nos países desenvolvidos, se iniciou um processo de questionamento relativamente ao tratamento tradicional aplicado às pessoas em condições de agravamento dos adoecimentos relacionados ao sofrimento mental, focado no modelo hospitalocêntrico que, em regra, correspondiam à condenação definitiva a algo comparável à pena de prisão, como afirma o escritor Michel Foucault em sua mais famosa obra “Vigiar e Punir”. Isso para não mencionar as precárias condições observadas nesses verdadeiros “depósitos” de pessoas, despojando-as de qualquer resquício de dignidade humana.
Mas, sem dúvida, o grande marco dessa mudança de visão se estabelece na Itália, no início dos anos 1960, com o trabalho revolucionário do médico psiquiatra Franco Basaglia no hospital de Corizia, e, posteriormente, em 1973, como diretor do hospital de Trieste, o colocando na condição de pai da reforma psiquiátrica mundial.
No Brasil, nos finais da década de 1970, com a passagem de Basaglia por aqui, o debate se intensifica, inaugurando o chamado Movimento Antimanicomial, gerando, mais de vinte anos depois, o início da reforma psiquiátrica local, com a aprovação da Lei 10.216/2001, a partir do Projeto de Lei – PL 3.657/1989, do deputado federal Paulo Delgado (PT/MG).
No dia 18 de maio é comemorado o “Dia Nacional da Luta Antimanicomial”, data em que, no ano de 1987, ocorreu no município de Bauru, no estado de São Paulo, o II Congresso Nacional dos Trabalhadores da Saúde Mental, tendo sido aprovada a “Carta de Bauru” que traz os princípios da Luta Antimanicomial, base para a redação do PL de Paulo Delgado. Vejam artigo publicado no nosso site em 18/05 deste ano 18 de maio: Dia Nacional da Luta Antimanicomial – Agora é para todos (agoraeparatodos.com.br).
Com base nas diretrizes estabelecidas na Lei 10.216 o Ministério da Saúde criou a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) na estrutura do SUS, cujo objetivo, conforme prevê a mesma Lei, é a substituição gradual da antiga configuração baseada nos manicômios e hospitais psiquiátricos, organizando e estabelecendo os fluxos para atendimento de pessoas com problemas mentais, desde os transtornos mais graves até os menos complexos. A RAPS conta com os seguintes componentes: Unidade Básica de Saúde, Núcleo de Apoio a Saúde da Família, Consultório de Rua, Centro de Convivência e Cultura, Centro de Atenção Psicossocial nas suas diferentes modalidades, UPAS 24 horas e Hospital Geral.
Abrange a atenção a pessoas com necessidades relacionadas a transtornos mentais como depressão, ansiedade, esquizofrenia, transtorno afetivo bipolar, transtorno obsessivo-compulsivo etc; e pessoas com quadro de uso nocivo e dependência de substâncias psicoativas, como álcool, cocaína, crack e outras drogas. E se baseia no princípio central da ressocialização.
Apesar dos avanços conquistados no tratamento humanizado às pessoas em condição de sofrimento mental no Brasil, modelo defendido pela OMS e reconhecido por várias instituições e especialistas, a implantação do sistema ainda encontra grande resistência em segmentos reacionários da nossa sociedade. Inclusive, o (des)governo Bolsonaro dificultou o quanto pode a reestruturação prevista na atual legislação, com a desarticulação de grande parte da RAPS, mas, felizmente, o processo atualmente já se encontra bastante avançado, sinalizando que sua plena consolidação é irreversível.